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Violência
Mais de 90% das cidades brasileiras não têm delegacia da mulher
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No ano em que a Lei Maria da Penha completa 13 anos e  os números de violência e feminicídio só crescem no país, as mulheres da grande maioria das cidades brasileiras não contam com uma delegacia da mulher para fazer um Boletim de Ocorrência (B.O) e muito menos com apoio multidisciplinar para sair do ciclo da violência doméstica.

 
Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados esta semana, mostram que em 91,7% dos municípios do país as mulheres vítimas de violência não têm como recorrer a uma delegacia da mulher.
 
De acordo com os dados de 2018 da pesquisa sobre o perfil dos municípios e estados, ao todo são 460 (8,3%) delegacias de mulheres em todo o país.  A maioria fica no  sudeste (195). O Centro-Oeste tem apenas 40 distribuídas  nos estados do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás e Distrito Federal.
 
“Estes números são consequências do fim do programa Brasil Sem Violência que o golpista Michel Temer extinguiu assim que assumiu o governo, depois do golpe de 2016 contra a presidenta Dilma Rousseff”, afirma a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, Juneia Batista.
 
“Obviamente, com essa decisão, toda política de atenção de combate à violência contra mulher também foi diminuindo e até acabando. Enfrentar a violência não foi prioridade para o governo Temer e muito menos será para o governo de Jair Bolsonaro e seus ministros”.
 
A dirigente lamenta que os investimentos em políticas sociais construídas com o movimento social e feminista nos governos democráticos e progressistas dos ex-presidentes Lula e Dilma estejam diminuindo rapidamente neste governo, justamente no momento em que os estupros, a violência e feminicídio estão aumentando.  
 
“Queremos respeito aos nossos corpos e às nossas vidas. Isso significa falar mais sobre um Brasil sem violência, mas com as mensagens misógenas e machistas de Bolsonaro e seus ministros não teremos políticas específicas para acabar ou diminuir com estas violências que sofremos todos os dias”, complementa Juneia.
 
Violência crescerá
 
Para a secretária das Mulheres da CUT, quanto menor o investimento em políticas públicas de combate à violência, mais violência ocorrerá. E como o combate a violência contra mulher não é uma política de Estado, como uma Lei, e sim de governo, é preciso lutar muito para essa realidade. “E a gente precisa pressionar o governo federal, o estadual e municipal o tempo todo se quiser mudar este quadro”.
 
A ex-secretária-adjunta de Políticas para Mulheres do governo de Fernando Haddad (PT), Dulce Xavier, concorda com Juneia. Para ela, com os governos neoliberais que tomaram conta dos estados e municípios nas últimas eleições os investimentos nestas políticas públicas só diminuíram.
 
“Eles desprezam as questões sociais e colocam as políticas afirmativas de direitos sempre como um privilégio. Com isso, os orçamentos nunca englobam o atendimento de políticas racial, de mulheres e LGTB”.
 
“Na disputa com os neoliberais a gente sempre perde, porque para eles quanto menor o estado melhor, mas para a vida das mulheres é fundamental o investimento. Não somos números, somos vidas”, destaca Dulce, que é também membro da Frente Regional ABCD de Enfrentamento da violência contra Mulher.
 
Não basta ter delegacias
 
O primeiro lugar onde as mulheres vítimas de violência vão procurar quando acontece alguma coisa com elas é a delegacia, de preferência a especializada em mulheres. Mas, segundo Dulce, “não basta ter delegacias”, tem de ter pessoal especializado e preparado para o atendimento.
 
“Tão importante quanto o Boletim de Ocorrência, ferramenta essencial para investigar e punir o agressor, é o apoio às vítimas para elas saírem do ciclo de violência. Muitas mulheres vítimas de violência não são bem tratadas neste locais, pelo contrário, já ouvi muitas reclamações de mal atendimento”, conta Dulce.
 
Juneia, que também é Assistente Social, disse que o atendimento em grande parte destas delegacias é precário e o que os funcionários alegam que têm pouca gente para trabalhar e ficam sobrecarregados.
 
“Além de falta de funcionários e trabalhadores treinados para receber e dar apoio às vítimas, as delegacias de mulheres muitas vezes não têm uma equipe multidisciplinar com psicólogos, assistentes sociais, infraestrutura e nem trabalham integralmente com o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas)”, afirma a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT.
 
É preciso votar em candidatos que têm compromisso com estas pautas, diz Dulce lembrando que ano que vem tem eleição. Segundo ela, é fundamental que as cidades tenham uma administração com recorte de gênero em todas as áreas de desenvolvimento.
 
“Temos que considerar que mais de 50% da população é feminina e se não tiver uma secretaria ou algum organismo com este status fica difícil discutir que é preciso iluminar os becos com a política de segurança, por exemplo. Se as mulheres não tiverem condição para dialogar com outros setores fica bem difícil entender a realidade das outras mulheres”, aponta Dulce.
 
Casas-abrigo
 
Os dados do IBGE também apontam que mesmo com a Lei Maria da Penha, somente 2,4% dos municípios oferece casas-abrigo, espaços para a mulher ficar, caso haja risco de vida.
 
Estes espaços são para onde as mulheres são encaminhadas pela assistência social quando elas não têm mais como morar com o “companheiro” violento. Como já se sabe, os parceiros são responsáveis por mais de 70% dos casos de feminicídio e violência doméstica.
 
“A mulher e seus filhos muitas vezes precisam sair das suas próprias casas para poderem sobreviver e as casas-abrigo são muito importante para o fim desta violência. Porque é lá que tem todo o acolhimento com psicóloga, assistência social e educadores sociais. Até arrumar creche e escola para as crianças, a casa abrigo pode ajudar”, explicou Dulce.
 
Como mudar esta realidade
 
Segundo Dulce, é preciso muita mobilização social e reivindicação para manter as políticas para as mulheres, além de investimentos em áreas como educação, cultura e comunicação.
 
“Se a população não estiver articulada e reivindicar seus direitos a tendência é piorar. Além disso, é preciso uma mudança cultural. Precisamos investir na educação, discutir igualdade de gênero nas escolas, apoio dos meios de comunicação voltados ao respeito e a diversidade e lógico não pactuar com a desigualdade em nenhum campo”, afirmou a ex-secretária-adjunta de Políticas para Mulheres da prefeitura de São Paulo, que foi extinta quando João Dória (PSDB), atual governador do Estado, foi eleito prefeito da cidade em 2016.
          

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